Quando eu era menino e cheguei à escola, a professora pediu que lêssemos em voz alta um texto que dizia: “Pedro estava sentado no fundo da sala”. Pensei: não, aqui não tem nenhum Pedro! Como isso é possível? Para mim, era simples: ou ele estava em um lugar ou em outro. E se ele estivesse aqui, deveria estar presente. Então, eu disse: não existe Pedro. Escrever é algo mágico, realmente mágico.
Continuei lendo: “Pedro se levantou” — Pedro se levantou? Onde está? Não tem ninguém de pé, muito menos o Pedro!— “e falou com a professora que tinha um problema e precisava ir para casa. Então, a professora autorizou sua saída”. Depois veio outra frase que estava escrita ali e eu mal pude acreditar!: “Estava chuviscando, ele abriu o guarda chuva e saiu”. Comentei: esse lugar não existe; não há chuvisco; nada disso! Então quer dizer que é possível fazer chover apenas escrevendo? Como isso pode ser racional? Como isso faz parte da cultura humana? Aquilo foi um verdadeiro sofrimento intelectual.
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SUMÁRIO
Apresentação – Giuliana Simões & Flávio Desgranges
Tom Zé e a Filosofia Brasileira: Ou passa a aprender com a rua ou não vai sobreviver
Ivo Mineiro Teixeira
INTRODUÇÃO
Capítulo 1 – mas o que salva a humanidade / é que não há quem cure a curiosidade
Capítulo 2 – Com quantos quilos de medo se faz uma tradição?
Capítulo 3 – tom zé, te explicando para te confundir
Capítulo 4 – Mas voltemos aos anos 60
Capítulo 5 – Apocalipsom A
Capítulo 6 – Tropicalea Jacta Est
Capítulo 7 – Marcha-enredo da creche tropical
Capítulo 8 – Tropicália Lixo Lógico
Capítulo 9 – considerações finais
Capítulo 10 – referências
Capítulo 11 – O osso da canção: conversas com Tom Zé
Capítulo 12 – Essa língua não se fala lá em casa
Capítulo 13 – Se houver fogo, eu entro como uma salamandra
Capítulo 14 – A novela da tonalidade
Capítulo 15 – Obstinado: a descoberta do Ostinato
Capítulo 16 – O que eles mais gostaram foi da afinação da orquestra
Capítulo 17 – Prazer. Só
Capítulo 18 – Sem emprego, sem tropicalismo, sem nada
Capítulo 19 – Os pios e os arrepios
Capítulo 20 – É um negócio de espanto, até de uma certa alegria, por eu ter outro jeito de compreender aquela família
Capítulo 21 – Os grotões de Irará
Capítulo 22 – Outra noção de tempo
Capítulo 23 – Contratempo universal
Capítulo 24 –Lixo lógico
Capítulo 25 – Tai chi em Montreux
Capítulo 26 – Um orangotango falando inglês clássico numa peça de Shakespeare
Capítulo 27 – Inacabamento
Capítulo 28 – A criança entortada
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Sobre a autora e autores
Flávio Desgranges tem desfrutado ao longo dos anos de encontros e diálogos prazerosos com Tom Zé. Em meio a tanta admiração, surgiu a ideia de organizar, gravar e publicar essas conversas, proposta que Tom Zé gentilmente aceitou. Atualmente, é professor do Departamento de Artes Cênicas da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e atua como professor colaborador na Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade de São Paulo (USP).
Giuliana Simões, desde a sua infância, teve a oportunidade de conviver com Tom Zé, que, por uma grande sorte e provavelmente devido a um
alinhamento especial dos astros, é seu tio. Ao observar o trabalho de Tom Zé, ela percebeu que a arte vibra e oscila de forma semelhante à existência; com base nessa perspectiva, tem se dedicado a investigar as tensões sempre mutáveis entre arte e vida. Atualmente, é professora do Programa de Pós-Graduação em Artes da Cena da Escola Superior de Artes Célia Helena (ESCH). Possui doutorado em Letras e em Artes Cênicas pela Universidade de São Paulo (USP).
Ivo Mineiro Teixeira é graduado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e, atualmente, bacharelando em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Apaixonado pelo Brasil e por esse indizível que faz a brasilidade, estudou como o tropicalismo e seu expoente filosófico Tom Zé moldaram política e filosoficamente nossa sociedade.